Abri meu site de pesquisas favorito (e de toda a humanidade) e busquei por "tendências 2019", uma instigante palavra-chave. Sem muita surpresa, é comum nos depararmos com resultados cíclicos para essa pesquisa: são releituras do que já vimos anteriormente reinterpretadas por um olhar atual, atemporal, histórico ou até mesmo abstrato.
Mas afinal, como podemos imaginar o que é uma tendência ou algo que possua atrativos para se tornar uma? Sinônimos como vocação, disposição natural e inclinação surgem atrelados à ideia de tendência e se desdobram para os mais diferentes setores. As tendências nada mais são do que necessidades descobertas (que não sabíamos que "precisávamos") para suprir ou complementar as demandas da sociedade e seus contextos sociais, culturais, econômicos, históricos e por quê não políticos? Muito mais do que uma necessidade, a tendência ressalta a atmosfera em que estamos atualmente vivendo e se traduz de modo bastante expressivo no intuito de criticar, analisar, estimular, enobrecer ou simplesmente instigar os pilares construtivos da sociedade.
Muito difícil? Vamos simplificar: no campo da Arquitetura e Design, durante muitas décadas nos deparamos com as chamadas "casas de revista", aquelas que parecem não haver pessoas habitando e que são tão 'perfeitas' no minimalismo de cada detalhe que te causam até um receio de se adentrar.
E a gente pensava: mas como é possível uma casa com tudo em seu devido lugar, como as pessoas sentam nesse sofá que está intacto, como se alimentam nessa cozinha tão clean que nem parece ter utensílios e alimentos dentro? É mesmo a casa de revista! Contudo, à passos lentos, mas gradativos, os contexto sociais desencadearam um certo descontentamento pelo fato de o design não mostrar a realidade. E qual seria? De que os espaços são habitáveis e por isso, devem ser humanizados de tal forma que contenham os elementos sociais, culturais e íntimos da pessoa que se insere neste ambiente. Com isso, chegamos à um estilo mais despretensioso que não tinha como intenção mostrar a perfeição: estava tudo em seu devido lugar, mas já era mais humano, mais aconchegante e favorável para morar e conviver.
Mas, nos últimos dez anos atingimos justamente o contrário do que era de certo modo imposto. Estamos na década da valorização do imperfeito, do inacabado, de modo a resgatar a memória e o tempo que passou, trazendo lembranças e a concentração de um design que prioriza a afetividade. Valorizar o imperfeito vai muito além do design de interiores e prega um conceito tão importante que corrobora para desmistificar padrões, seja de qualquer contexto.
Para que as alterações de contexto fossem inclusas na Arquitetura de interiores, foi necessário uma ressignificação de materiais, cores, texturas, acabamentos e adornos que facilitassem essa nova transição. Neste ponto, as superfícies foram remodeladas às tecnologias vigentes e a busca por um design genuíno, voltando às raízes e a sua essência foram, sem dúvidas, o grande ponto de partida para as grandes empresas e fornecedores.
O primeiro grande impacto foi na estrutura dos interiores: sabemos que as casas da década de 60 e 70 tinham cores mais intensas com muitas estampas impressas nos pisos e nos históricos ladrilhos hidráulicos, além de formas mais arredondadas e rebuscadas. Depois de tanto minimalismo, é bem provável que nossos olhos (e nosso coração) sentiram falta da alma da casa, da personalidade e de memórias que tanto nos fizeram bem tempos atrás.
E o legado dos pisos de caquinho? Utilizados por volta da década 40 no Brasil, as cerâmicas quebradas garantiram espaço em suas tonalidades marcantes do vermelho, amarelo e preto. A ideia de criar algo semelhante a um mosaico partiu de um dos funcionários de uma fábrica e se expandiu para a classe média paulistana. Anos e anos de tecnologia empregada, nós já estávamos muito acostumados aos porcelanatos com impressão FULL HD que imitam com perfeição os amadeirados, as pedras naturais e o cimento bruto. Mas as lembranças que o caquinho deixaram fez com que houvesse uma retomada deste padrão de decoração e ele retornou em outros tipos de superfícies como os próprios porcelanatos e até mesmo papeis de parede que criam uma releitura do caquinho e do granilite.
Um outro ciclo de tendências pontua o apego com a natureza atrelado consequentemente à falta de contato que temos com a mesma. O que estamos chamando atualmente de Biofilia (amor à vida, à natureza) impulsionou a estamparia de tecidos, o design de revestimentos e as demais superfícies à trabalhar motivos da fauna e flora em seus processos criativos, além de uma constante pesquisa de mercado para promover produtos de caráter ecológico, estimulando as peças artesanais e incluindo maior valor agregado.
Agora uma pausa: por quê é tendência imitar materiais? Estamos falando sobre a recorrência em falar sobre a natureza, sobre elementos naturais e como valorizá-los, mas, ao mesmo tempo que isto se apresenta como uma vertente, surge no caminho contrário a tendência de imitar os materiais naturais em texturas sintéticas. Isso pode ser visto de duas maneiras complementares: as tecnologias evoluíram de tal modo que a reprodução de qualquer superfície é algo que demanda estudos, mas é totalmente possível. Além disso, precisamos considerar que a exploração de materiais naturais é tão intensa (estamos falando de pedras e principalmente da madeira) que ocorre a necessidade de imitar e replicar estes materiais de modo sintético para atender à demanda. E por consequência, é sabido que quanto menos recursos disponíveis, mais precisamos recorrer à imitação já que o valor dos produtos em sua composição natural possui preços muito mais elevados. Mas, somado a estes fatores está sendo levado em consideração a funcionalidade mais ampla de um mesmo material e a sua aplicabilidade. Vajamos por exemplo a madeira teca: é praticamente a única que resiste à umidade e poderíamos aplicar nas áreas molhadas como o box de um banheiro. Obviamente o valor não compensa, então chegamos ao ponto de criar uma impressão FULL HD tão imponente que os porcelanatos são - quase - mais amadeirados do que a própria madeira, ainda que mantenham suas propriedades físicas (ainda, pois não é difícil um dia conseguirem adaptar a temperatura do material ao conforto térmico da madeira: quem sabe?!).
Segundo grande exemplo: os incríveis veios que se reproduzem naturalmente nos mármores e granitos são de uma beleza única, que independe de tendências. Contudo, o alto valor agregado de alguns mármores, como o Calacata, muitas vezes impedem sua especificação em projetos de interiores e exteriores. Juntamente com o fator de valor, está também o peso, a demanda para transporte, as importações e exportações da peça e um dos principais agravantes: o próprio material que por apresentar uma porosidade significativa comparada às pedras sintéticas, não é recomendado para áreas molhadas como as bancadas e os pisos. Novamente, os porcelanatos e as cerâmicas que imprimem a réplica do material natural ganham um excelente espaço no setor de revestimentos.
Outro ponto a ser tocado são as cores: tendências de cores são complicadas de desmistificar porque todas elas fazem parte do cotidiano e ainda assim outras são mais expostas e caem em evidência. Mas por que isso ocorre? A cor e a psicologia trazem uma intrínseca relação e o uso delas depende muito do que já falamos anteriormente: do contexto. A sociedade passa por períodos de instabilidades, crises, prosperidades, anseios que são compartilhados e transmitidos para cada indivíduo. Este, por sua vez, absorvem as inquietudes externas e mergulham em novas necessidades que até então pareciam não existir.
E existe necessidade por cor? Sim! Existe o momento que precisamos de conforto, de uma atmosfera tranquila. Tem momentos que a sociedade está tão doente que parece que todos precisamos de uma cura, de uma esperança. Por fim, tem momentos em que os ciclos se finalizam e precisamos do otimismo necessário para iniciar o próximo, com muita garra e prosperidade. Tudo isso está desde sempre representado na cor e em sua psicologia retratada.
Estamos no ano de paletas mais sóbrias, voltadas para tonalidades terrosas e fechadas; e em contraponto estamos com o 'Coral Vivo', cor eleita pela Pantone.. Ela é meramente comercial? Também! Mas, trouxe consigo um forte apelo social com relação aos recifes de corais e no intuito de estimular a preservação da vida marinha.
E junto a esta questão social, o coral vivo é claramente uma tonalidade estimulante, otimista e que visa criar uma nova atmosfera ao que estamos vivendo. De forma simultânea, a cor é enérgica, dinâmica, mas traz um acolhimento pontuado por essa pincelada de rosa que existe em sua composição. Utilizada em pequenos detalhes ou em grandes superfícies, é uma cor que se equilibra nos espaços, se complementa aos materiais naturais e se destaca de uma paleta mais sóbria, a qual já estamos mais acostumados.
Nas tendências, seguem os padrões terrosos de terracota, ferrugem, mostardas, bem como as cores fechadas que envolvem os verdes musgos e azuis marinhos, o que foi chamado recentemente de paleta modernista. Todas essas tonalidades possuem em comum a presença do cinza em sua composição, deixando-as mais fechadas, sóbrias e saturadas.
E com relação às regras de decoração? Certamente a grande tendência é quebrá-las.
Hoje podemos concluir que o design de interiores quebrou tantas regras que a única coisa que respeitamos tem como raízes a Gestalt e a Psicologia da Forma, visto que sem equilíbrios, harmonias, contrastes e destaques não existe o projeto, apenas superfícies jogadas no espaço.
Afinal, por que o que não parece atrativo hoje pode ser incrível amanhã? Acredito que isso depende quase que exclusivamente do momento, da aura e da atmosfera em que estamos. Depende da releitura que desenvolvemos a respeito de algum conceito e de nossas próprias necessidades que se acumulam ao longo dos dias. Quando massivamente estivermos dispostos ao resgaste, é automático que o ciclo se retome. A verdade é que o ser humano está sempre cativado pela inovação e como ela tende ao infinito, resta para nós usufruir e 'sugar' todas as possibilidades e releituras de uma mesma coisa: aquilo que anteriormente nos trouxe uma memória, uma lembrança e merece reconquistar espaço e... o nosso coração!
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